No aniversário de São Paulo em 1971 o então prefeito Paulo Maluf dava de 'presente' para a cidade o elevado Presidente Costa e Silva, a via elevada de mais de 4 quilômetros que singra o Centro em direção a zona oeste. A obra feia que corta os bairros de Santa Cecília, Higienópolis e Vila Buarque e que é considerada um marco no processo de desocupação do Centro porque produziu uma desvalorização por onde 'fez sombra' foi recebida pela cidade com festa nas comemorações pelos 417 anos e
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primeira página da Folha de SP em 24-01-1971 |
Quando assumiu a prefeitura pela primeira vez em 1969, nomeado pelo então presidente Costa e Silva, o engenheiro Paulo Maluf imprimiu um ritmo de inauguração de obras nunca visto antes na cidade. Sempre grandes e de muita visibilidade e seguindo a vocação do transporte automotivo em detrimento ao transporte coletivo. No ano que Maluf assumiu, carro era um desejo de 80% dos paulistanos segundo um estudo da Folha.
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Chamada para anúncio da Folha que mostra o desejo do paulistano por carros. |
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Anúncio da Loja Clipper na Folha. A cidade empolgada com a grande obra. |
Pouco mais de um ano depois, com pompa e honraria, Maluf convocava a população a conhecer 'a obra que é a maior do gênero em toda América do Sul, eternizará em sua denominação uma das grandes figuras da revolução de 1964'. Agora o paulistano poderia comprar carros já que possuía uma grande via e Paulo Maluf de uma só vez ganhava em visibilidade ao entregar o elevado e homenageava seu padrinho político.
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Folha de SP 24 janeiro de 1971 |
Na edição do dia seguinte a Folha mostra a festa de inauguração, a marcha pela via elevada mas não fala sobre a opinião dos moradores dos prédios vizinhos a obra. Passando a apenas 5 metros das janelas dos prédios o Minhocão (como é mais conhecido) foi uma obra engaveta pelo Prefeito Faria Lima pela sua brutalidade. Uma vez prefeito, Maluf não exitou em tocar a obra que chamou de mal necessário. Até 1976 o trafego de carros foi permitido ali sem nenhuma restrição nem respeito aos moradores da região. Só em 1989 na gestão Erundina foi determinado que o local ficasse fechado das 21:00 as 6:30 e depois que pudesse ser utilizado para lazer nos finais de semana.
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Folha 25 de janeiro de 1971 |
Foi Luiza Erundina aliás a primeira a defender a demolição do Minhocão em 1992. A alegação de Erundina era de que o Minhocão era o principal responsável pela degradação do trecho central do eixo Leste-Oeste da capital, atraindo moradores de rua e usuários de drogas. Mas ela não conseguiu levar o plano adiante justamente porque sua gestão acabou e seu sucessor - o mesmo Maluf - preservou a obra.
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O Elevado visto das sacadas dos muitos apartamentos que ele circunda. |
Por causa principalmente da depreciação visual causada pelo elevado, o ex-prefeito José Serra, que classificou o Minhocão de "aberração", trouxe o tema de volta às discussões municipais em 2006. Criou um concurso arquitetônico para destinar fins a cicatriz urbana. A ideia de Serra já era desviar todo o trânsito para uma futura avenida, a ser construída em áreas ociosas ao lado dos trilhos da CPTM. Ele chegou a anunciar um custo de R$ 80 milhões para a demolição com entrega em 2025.
Um artigo com a história do concurso arquitetônico está na revista eletrônica Au e há poucos dias, sem muito barulho a prefeitura Kassab, por recomendação do Tribunal de Contas do Município engavetou o projeto que pretendia o enterramento dos trilhos do trem entre a Barra Funda e a Estação do Brás e a construção de uma avenida de 12 quilômetros nesse local. Isso, por sua vez, permitiria a demolição do Elevado Costa e Silva (Minhocão) sem causar prejuízos ao trânsito do centro.
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O elevado já serviu por várias vezes de espaço para eventos culturais |
Dos muitos nomes e títulos que São Paulo tem é o de ser a cidade da metamorfose, das transformações. Não foram poucas as vezes em que o elevado, mesmo com sua frieza e feiura foi palco de eventos culturais. Por vezes seus pilares serviram de obra de arte. Por conta disso é que acredito que no futuro, uma cicatriz tão grande como o minhocão seja retirada do cenário da metrópole, quer seja pela sua imagem 'aberrativa' quer seja pelo passado a que sua presença remete.